sexta-feira, 23 de março de 2018

Aos trancos e barrancos




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Tem que ver. O clima de desordem e desassossego naquele país —não é preciso dizer que país é este, né?!— é inquestionável. O pau tá comendo solto. Polícia pra todo lado, toque de recolher, forças armadas na rua, intervenção federal, uma zorra geral. Aí, prenderam o cara famoso das redes sociais —o king das
fake news das redes sociais. Sabe como é, nessas horas graves para a nação, boateiro é um perigo. E prenderam o maior boateiro do país. E condenaram o boateiro à morte. Amarraram o boateiro num poste da comunidade, prenderam uma venda nos seus olhos e tenente logo gritou "fogo!".
E soldados mandaram bala. O boateiro caiu no chão, morto. Aliás, não. Caiu no chão, pensando que estava morto. Aí, descobriu que nem estava ferido. A não ser aquela coisa quente ali, entre suas pernas, fosse sangue. Não era. Ele estava era todo borrado, mesmo. Caído ali no chão, humilhado, o moço do Facebook percebeu o tenente se aproximar, levantá-lo, tirar-lhe a venda dos olhos e dizer:
— Aprendeu, seu cuzão? Te serviu a lição? Nós decidimos só te pregar um susto pra você aprender a não ficar pela aí com embromação. Usamos balas de festim. Espero que o susto te tenha ensinado a parar de velhacaria. E soltou o boateiro, que saiu correndo na subida do morro e, meia hora depois, já estava no meio da rua:
— Como é? — perguntou o primeiro fofoqueiro que ele encontrou. — Sabe de alguma novidade?
— Tá sabendo? — respondeu o boateiro — Não conta pra ninguém, nem no Face, mas, tô com a certeza de que tá faltando munição no Exército!
Essa história é só pra demonstrar que o boato, a farsa, a mentira, o cambalacho, a maroteira, trapaça etc. não são exclusividades brasileiras, porém preponderam na vida da nação.
O recente assassinato da vereadora carioca Marielle Franco demonstra como a velhacaria é uma marca bem brasileira. Inventou-se muita mentira contra e a favor da política que foi morta sabe-se lá por quem e que provocou uma comoção nacional. Sua morte certamente terá sérias consequências no jogo político eleitoral que serve de cenário para as eleições nacionais de 2018. Sua morte sangrenta deixou o ódio flanando no ar.
Na leitura e audiência dos veículos de comunicação a gente logo percebe que o clima social e político está fervendo. Neste início de campanha eleitoral, quando não se sabe ainda quais os concretos competidores, o clima se mostra pesado, cheio de zangas, com facções brandindo armas principalmente nas redes sociais e nas movimentações de rua. Vejamos. O assassinato da vereadora Franco, após toda a comoção ameaça ampliar a polarização ideológica.
Fake news invadem as redes acusando a vereadora de envolvimentos espúrios. Até uma magistrada entrou na onda de acusações mentirosas. Verbos da esquerda e da direita exibem elevada taxa de ódio. O ódio apareceu também nesse começo de andança de Lula da Silva no sul do país. Fazendeiros e trabalhadores fizeram piquetes com tratores e carroças, atrapalhando o percurso do comandante petista, que malvadamente usa um slogan hitlerista em sua caravana: Lula pelo Brasil (em 1932, Adolf Hitler apregoava "Hitler pela Alemanha"). Poucos apoiadores e militantes apareceram. A praça sulista abriga um forte pensamento conservador, situação que deveria ter sido analisada pelos organizadores do périplo.
Ainda não está fatalmente tarde para lavar os olhos para enxergar a realidade brasileira. É hora de passar o Brasil a limpo: só assim o povo terá vez. Um dos caminhos é retirar a mentira do cenário político. A farsa precisa acabar definitivamente. Ponha o cérebro pra funcionar a toda, companheiro —não é possível continuar com a atividade cerebral incompleta. Faça força de verdade. Parafraseando Darcy Ribeiro, se o brasileiro continuar vivendo aos trancos e barrancos como vem fazendo até agora, o Brasil vai continuar dando em nada.

Luca Maribondo — lucamaribondo@uol.com.br | Campo Grande | MS | Brasil






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