segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

_Presentes de última hora

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Natal. Natal é a festa do nascimento de Jesus Cristoportanto, a maior celebração do cristianismo—, comemorada no dia 25 de dezembro desde o séculopela Igreja ocidental e desde o séculopela Igreja oriental. Mas desde o século 20 deixou de ser uma festa religiosa pra se tornar um evento meramente comercialprincipalmente pra marqueteiros, lojistas, publicitários, industriais e outros envolvidos com o marketing natalino—, determinados em vender cada vez mais pra gente como você e eu.

Essa gente preocupada em ganhar cada vez mais, sempre quer dizer que mercadorias devemos comprar pra presentear os consortes, os namorados, os filhos, os amigos etc. etc. e tal. Nesta terça-feira, 24 de dezembro, resolvi dar pitaco nessa história de comprar presente de Natal, preocupado que sempre estou com aquele brasileiro que deixa pra fazer as coisas no limite do tempo... E agora é o derradeiro momento pra fazer a compra dos seus presentes; senão, vai dar presente depois do Natal.

Vamos lá! Como o nome está a indicar, o presente de Natal é um mimo que as pessoas dão umas às outras por ocasião das festividades natalinas, criadas pra comemorar o nascimento na Terra do filho de Javé. Essas festividades, que incluem comilanças e beberronias fartas, são celebradas, no mais das vezes, no mês de dezembro; registram-se, porém, de quando em quando, exceções que comprovam a regra (toda regra tem exceção).

Uma dessas exceções durante a batalha de Hattin, quando, por temer-se durante o cerco de Saladino —A Batalha de Hattin, nos Cornos de Hattin, foi uma grande derrota dos cristãos nas Cruzadas. A batalha ocorreu em 1187 e os muçulmanos reconquistaram Jerusalém— à cidade que na data tradicional os mouros estariam de posse da cidade, o Natal foi celebrado em outubro.

Outra deu-se em Puxa Faca, mui tradicional e honrada urbe do Estado de Roraima, quando, devido ao atraso do pagamento do décimo-terceiro salário, o Natal acabou sendo celebrado em junho, juntamente com o advento do inverno (o que tornou o Natal um pouco mais europeu), acontecendo, por conta disso, naquele ano, dois Natais: o de junho, ou seja, o Natal de Santo Antônio, e o de dezembro, ou seja, o Natal propriamente dito.

Mas voltemos ao presente. O presente de Natal vem geralmente sob a forma de embrulho pra presente, podendo, contudo, assumir aspectos não tão convencionais, isto é: bilhete da Mega-Sena premiado, um casal de gêmeos, uma herança, uma dívida paga em dia, a secretária gostosinha que aceita participar de um jantar a dois, um amigo que ganha a eleição pra senador etc.

O presente de Natal convencional, ou seja, aquele que vem embrulhado com papel estampado, caixinhas decoradas, fitinhas coloridas, é geralmente entregue na véspera do Natal, em geral até pouco antes da meia noite, e desembrulhado no ato da entrega. Esta operação é, geralmente, coletiva, isto é, realizada por muitas pessoas ao mesmo tempo, sendo acompanhada da emissão de sonsOh!, Ah!, Muito obrigada, não precisava tanto! Feliz Natal!— e de gestos como abraços, beijos, selinhos e levar o copo ou o garfo à boca.

De maneira geral, as mulheres esperam receber como presente de Natal algunsou todos— os
seguintes itens: carro último tipo, jóias estonteantes, perfumes muito raros, vestidos de estilistas exclusivos, dotes infinitos de sedução, laptop ou iPad de última geração, empregadas perfeitas, amor-admiração-fidelidade (não necessariamente nessa ordem) de todos os homens, babás impecáveis, filhos angelicais, juventude eterna. Recebem, geralmente, meias, echarpes, bolsas, lenços, bijuteria, celular, livro de auto-ajuda, tecido, creme hidratante, kit de maquiagem.

Os homens, por sua vez, esperam receber como presente de Natal alguns dos seguintes itens: virilidade permanente, salários fabulosos, carro possante, poder imenso, amor de muitas mulheres, prestígio invulgar, juventude eterna. Recebem: par de meias, cuecas, gravatas, carteira de couro, caneta, celular, loção-após-barba, livro de auto-ajuda.

as crianças recebem brinquedos, roupas, material escolar, lições de moral, bicicleta, bola de futebol, celular, cds, tocador de mp3 —isso porque não existe livro de auto-ajuda pra pirralho. Gostaria de receber: laptop, televisão o dia inteiro, não ter de lavar as mãos antes das refeições, não ter de ouvir lições de moral, pacotes de balas, poder ir pra cama mais tarde sempre.

Falando agora do Natal tão tardiamente, vejo que muita coisa está mal nesta história —e não com os presentes. Por exemplo, o papai Noel é  um falso. Não é pai coisa alguma, mas um daqueles tios afastados que as pessoas nunca vêem e que uma vez por ano chega em casa para nos dar meias e ainda temos que lhe oferecer guloseimas.

E as crianças adoram, porque, ao contrário dos tios, Papai Noel dá pena por causa daquela barba grande e branca de mendigo e aquele traje vermelho de quem não tem mais nada pra vestir. E pronto, deixamos que ele entre em nossa casa porque em vez de curtir sua própria vida, anda de casa em casa num anacrônico trenó, puxado por renas um tanto fantástica ( viu rena voar?! —aliás, no Brasil nem tem rena) e todo mundo acha fofo.

Nós não admitíamos isto a mais ninguém, certo? Andar um ano inteiro sem chutar o balde ou o pau da barraca e se comportar que nem santinhos para, uma vez por ano (quando nãocrise, porque até o velhote a sente), um gordo que não faz a barba, com um barrete ridículo e vestido de vermelho, entrar pela nossa casa adentro com o risco de partir a chaminé (ou o exaustor, quiçá) para nos dar coisas tão interessantes como cuecas, meias ou camisolas.

É para este senhor que vai o dinheiro dos contribuintes? É que ainda por cima goza da gente… Andamos o ano inteiro preocupados com o preço da gasolina e dos remédios e o velhote chega com renas voadoras e vermelho (em excesso de velocidade para conseguir passar por todas as casas numa noite) e ninguém o multa e nem ele nos diz o que dá às renas para elas ficarem assim tão ensandecidas. Estou pura e simplesmente irritado com o Natal —acontece em todos—, por haver chegado tão cedo neste ano: as lojas estavam anunciando o Natal desde outubro.


E termino assim a minha reclamação e aviso desde : não me falem no Natal. Peço imensa desculpa, mas vou ter que acabar por aqui, até porque não sei que desfecho devo dar a esta história que decidi escrever porque resolvi ajudar os amigos que deixam pra comprar os presentes na última hora e me fazendo antever que este será mais um Natal especialmente chato, já que estou longe do país. Mas me obrigou a pensar nos presentes que darei e na grana que vou gastar, e mais uma vez sem saber se dou os melhores presentes por generosidade ou por conformismo.

Luca Maribondo
24 de dezembro/2013
Umalas | Bali | Indonésia

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