Estava
eu num botequim, conversando com alguns amigos e conhecidos eventuais. Um
deles, que bebia um desses coquetéis de cor estranha e cheio de pedacinhos de frutas, me
disse que ouviu falar que veado no sentido de homossexual escreve-se com
"i", ou seja, grafa-se "viado". "Veado é o bicho, não
a bicha", disse ele. E riu.
Ao ouvir afirmação tão categorizada, comecei a refletir (pasmo!, diga-se) a respeito
da situação atual brasileira e, porque não, mundial. Será que as pessoas não
sabem mais do que falam? Só repetem o que ouvem por aí, principalmente nas redes sociais? Pense um pouco,
uma multidão gritando empolgada: "nessa festa só tem viado";
"olha a viadagem"; "a presidente Dilma é lady" e por aí vai.
Isto é, no mínimo, ridículo.
Para
confirmar como me abismei —do verbo abismar (eu abismei, tu abismaste, ele
abismou etc.)—, numa entrevista sobre sociologia do ciberespaço, analisei o nosso
momento atual, dominado pelo internetocentrismo (provocado pelo antropocentrismo
virtual), no qual conceitos como tautologia, cibercultura, comutação, sociedade
do espetáculo, mostram o quanto nossa sociedade é superficial e
despreocupada com a significação (no sentido semiótico) das palavras. O Facebook
está aí pra não me deixar mentir.
Só
pra não deixar ninguém voando: cibercultura é uma relação de trocas na sociedade numa relação entre cultura, novas
tecnologias e a emergência da Internet na comunicação pessoal e social. Também é termo
usado no conceito das comunidades virtuais que popularizam o uso da Internet e
das tecnologias de comunicação. A cibercultura é um estabelecimento de
relações, uma aproximação entre indivíduos, através das novas ferramentas
virtuais.
Se alguém
se comunica assim, pode-se afirmar que é um ciberculto. A cibercultura já está
presente na vida cotidiana de todos os indivíduos que se relacionam com o mundo
através da tecnologia digital. As recentes tecnologias são ferramentas, meios,
para o contato entre pessoas e objetos, que gera um conceito de tecnologia intelectual.
Fui claro? Claro que não! |
Veja,
o ciberespaço é uma virtualização da realidade, o que faz as pessoas migrarem
do mundo real para o mundo virtual. O ciberespaço, na mente das pessoas, torna
o espaço e o tempo físico variável. A cibercultura está mudando o imaginário e
as relações humanas, muitas vezes de forma subjetiva e interativa. A sociedade
hoje —e futuramente— se comunica e se relaciona cada vez mais através das
tecnologias de comunicação, construindo laços emocionais, acordos e atividades
profissionais, acesso à realidade política, social, cultural e mercadológica de seu países, e
dados remotos. Fui claro? Claro que não.
Mas
vou deixar minha digressão de lado. O que eu quero dizer é que essa
cibercultura tem seu lado bom e seu lado ruim: um destes é levar as pessoas à Era
do Achismo. Hoje em dia, ninguém estuda mais nada profundamente, ninguém
conhece nada profundamente. O simples fato de ler uma reportagem sobre
fertilização de camaroas com óvulos de baratas paleolíticas, já faz de qualquer
pessoa um profundo conhecedor de genética pré-histórica criogênica. E afirmar
que essa tecnologia poderá criar camarões voadores ou baratas comestíveis.
E o
que é pior, uma pessoa que lê essa reportagem, se sente no direito de, no meio
de uma discussão de bar, dizer: – “Não! Vocês sabem que de fertilização de camaroas
eu entendo!” E todos se rendem ao argumento de autoridade do boquirroto. Sem
nenhum argumento ou contra-argumento. Erística? Ninguém sabe do que se trata.
E não
estou nem falando dos erros e vícios de linguagem que vêm se tornando cada vez
mais comuns, nos meios de comunicação de massa, de onde deveriam sair textos
mais escorreitos. “A nível de” está em tudo quanto é canto; zero à esquerda de
números simples (zero que ninguém lê em voz alta, porque desnecessário); e o
uso excessivo do gerúndio recheia os discursos de pseudo-intelectuais, cuja
credibilidade permanece intacta, graças à ignorância geral da plebe ignara.
Quem frequenta as redes sociais sabe bem do que estou falando.
Os
poucos sobreviventes, sentem-se cada vez mais isolados, como em pequenas ilhas
de conhecimento rodeadas por um ror de gente politicamente correta. Não é
difícil ver uma pessoa ser discriminada por utilizar o português corretamente,
em uma conversa —criou-se até a locução preconceito linguístico pra discriminar essas pessoas.
Isso
tudo chega a ser revoltante: os defensores do tal preconceito linguístico defendem
a ideia de que temos de aceitar os erros dos ignorantes e tentar compreender o
que dizem e escrevem, mesmo que seja impossível entender o que desejam comunicar. Mas o pior de tudo, é ter de aceitar as reclamações dos
amigos que acham que somos gente cabotina, que falamos "difícil"
apenas pra nos mostrar superiores.
Pra
concluir. Fui procurar nos dicionários pra ver se os léxicos consagram a grafia
"viado" pra denominar os homoafetivos brasileiros. O Dicionário
Houaiss diz que viado é um tecido de lã, com riscas ou veios; e menciona ser parônimo
(dois ou mais vocábulos que são quase homônimos, diferenciando-se ligeiramente
na grafia e na pronúncia ou palavra cujos fonemas podem confundir-se com os de
outra) de veado. Já o Aurélio nem menciona o vocábulo. O Dicio e o Caldas Aulete abonam o
Houaiss.
Logo,
viado nada tem a ver com gays. E veado é bom não usar, porque vai contrariar os
mencionados gays e homoafetivos, que podem taxar quem usar a palavra de homofóbico.
Termo que configura outra dessas falhas criadas pelo "ouvi dizer".
Pura intolerância.
Intolerância
que começou no momento em que passaram a utilizar uma palavra inadequada para
dar nome ao problema: homofobia é uma doença. Você pode ir contra as pessoas
porque elas têm uma atitude execrável, mas nunca porque são portadoras de uma
moléstia. Execrar um homófobo é mais ou menos a mesma que ter aversão a um
canceroso ou um portador de hiv.
Etimologicamente,
o vocábulo mais aceitável para a ideia expressa seria homofilofóbico, que é
medo de quem gosta do igual. Mas quem iria usar essa palavra tão escalafobética?
Imagine o apresentador de um telejornal tendo que ler em voz alta a palavra homofilofóbico
e depois ter de explicar seu significado ao distinto público telespectador.
Melhor as pessoas continuarem sem saber o que dizem. O Facebook vive disso: a
ignorância diverte (eu rio muito no Facebook). Tem até comediante se
aproveitando disso: assista programas como o CQC e Pânico e vai entender do que falo. É a ignorância usada
como provocadora do riso, como a maquiagem do palhaço.
Luca Maribondo
19 de dezembro/2013
Umalas | Bali| Indonesia
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