terça-feira, 25 de junho de 2013

_natan.donadon@camara.gov.br a s.berlusconi@governo.it

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Caro Papi.

Será que posso chama-lo pelo apelido carinhoso “Papi”, que a menina Noemi Letizia colocou em você? E me perdoe por estar te mandando esta mensagem para seu email do Governo da Itália, mas foi o único que encontrei —e, aliás, acho que você deveria ainda estar morando no Pallazzo Chigi, na bela Piazza Colonna.

Estou te escrevendo porque soube hoje pelas gazetas locais que você foi condenado a sete anos de prisão por abuso de poder e prostituição de menor. E você só foi acusado de manter relações com a tontinha da Ruby, quando ela ainda era menor de idade. E usou o cargo para conseguir a sua liberação de uma delegacia de polícia. O que eles queriam? Afinal, você era primeiro ministro; poderia tirar qualquer um da cadeia, não é mesmo?

Papi: sete anos de galera
Fiquei chocado ao saber que o Tribunal de Milão condenou você nesta segunda-feira por ter levado a Ruby, ou Karima el-Mahroug (bem feito por você comer alguém com um nome desses). Mais escandalizado fiquei ao saber que, além da prisão, você ainda foi condenado ao banimento da política italiana até o fim de sua vida. Ta certo que não falta muito pra ela chegar ao fim, mas você merece algo melhor. Desculpe o linguajar, mas puta merda!, resolveram mesmo acabar com você!

Estou dizendo isso, porque eu também fui condenado aqui. Peguei mais de 13 (mais que você!) anos de cadeia. Foi o Supremo Tribunal Federal (STF) (mira só que chique, o próprio STF me condenou ) que está mandando para atrás das grades por formação de quadrilha e peculato. Mas você pensa que estou na cadeia? Não peguei um minuto sequer de cana. E ainda estou deputado, lépido e faceiro.

E é este o motivo da minha mensagem: te convidar pra vir pro Brasil. Você se lembra do Cesare Battisti, seu conterrâneo condenado por terrorismo e assassinato? Pois é, ele agora está morando em São Paulo —cidade onde vivem muitos conterrâneos de vocês— há um mês. O italiano alugou um apartamento de 90 m² nos Jardins. O senador Eduardo Suplicy (PT-SP) serviu de “fiador moral” para o terrosrista e conversou com a corretora de imóveis que queria referências do inquilino.

O senador petista (não gosto desse povo do PT, mas o Suplicy é legal) disse que “o Cesare é correto e que saiu um livro agora, ‘Os Cenários Ocultos do Caso Battisti’, do Carlos Lungarzo, que mostra que ele é inocente nos assassinatos”. E tem mais: diz o senador que o Battisti está se instalando na capital paulista porque, em breve, deve assumir “algum compromisso profissional” na CUT (Central Única dos Trabalhadores).

Você lembra? O Battisti foi condenado à prisão perpétua na Itália pelo assassinato de quatro pessoas em 1970. E depois fugiu para o Brasil. E agora, como te contei, mora aqui até hoje e ainda por cima vai ter um emprego na CUT, central de trabalhadores ligada ao PT, partido do governo, ao qual meu partido, o PMDB, é ligado.
Donadon, o convite

Venha você também. Nós adoramos um meliante italiano por estas plagas. E aqui as pessoas nem se importam que você seja um malfeitor, brasileiro ou não. Talvez você possa até se candidatar ao Senado. Você já está com 76 anos, né? Já está na idade de ser senador e será apenas mais um parlamentar fora-da-lei, como tantos outros que existem por estas bandas.

Sei muito bem que para cuidar dos direitos do cidadão o parlamentar tem de ser um cidadão direito. Mas quem conhece melhor o lado direito da vida do que um sujeito torto na vida? Um grande abraço do amigo

Donadon

PS. Sou descendentes de italianos, viu?!


Luca Maribondo
à moda de Elio Gaspari


quarta-feira, 19 de junho de 2013

_Perguntas cínicas

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Nos raros momentos em que, no Brasil, o povo vai para as ruas buscar melhorias pra sua vida social e política, um assunto recorrente sempre vem à tona: a eterna caixa preta da corrupção —e a palavra cínico e seus derivados aparecem com notável freqüência na mídia.

Originalmente, cínico é o adepto da doutrina dos filósofos gregos Antístenes de Atenas (444-365 a.C) e Diógenes de Sinope (400-325 a.C.), que se caracteriza especialmente pela oposição aos valores sociais e culturais em vigor, com base na convicção de que não é possível conciliar leis e convenções estabelecidas com a vida natural autêntica e virtuosa. É o que está no Dicionário Houaiss.

No mesmo dicionário, a gente fica sabendo que, por extensão de sentido, cínico é aquele que afronta ostensivamente as convenções e conveniências morais e sociais; ou aquele que é dado a atos e/ou ditos imorais, impudicos, escandalosos; desavergonhado, debochado, sarcástico. Mais ainda: é aquele que fala ou age com descaso, impudência, falta de escrúpulos; petulante, atrevido. Muita coisa, não?

Há alguns anos, recebi, através de email, texto anônimo no qual o autor faz uma alentada defesa do cinismo. Uso partes desse texto e algumas idéias minhas pra também propugnar pelo cinismo. Os filósofos cínicos, de acordo com Bertrand Russel em sua “História da Filosofia Ocidental” se perguntavam: “como podem os homens ser virtuosos num mundo mal, ou felizes num mundo de sofrimento?”. Serve de base teórica para os políticos que se defendem, quando acusados de corrupção, argumentando que “não sou o único... Todos fazem” ou não?

Desde 1889 —67 anos depois da independência—, ano da fundação da República brasileira —implantada a partir de um golpe militar— os eventos políticos tupiniquins caracterizam-se por um grau de corrosão que beira o absurdo. Houve momentos em que a corrosão foi maior, como quando aconteceu o golpe militar de 1964, ou na posse de João Goulart, ou ainda nas estranhas mortes de Juscelino Kubitschek e Tancredo Neves, na deposição de Fernando Collor, na aprovação da reeleição de Fernando Henrique Cardoso.

Cronistas e analistas que estão na lida historiando os costumes de nossos representantes nos três poderes, principalmente no Parlamento, sempre repetem uma palavra mágica: a atitude e a fala dos parlamentares e dos agentes do governo, para não falar nas togas, têm sido alcunhadas de cínicas. Em defesa da verdade factual e histórica, é preciso dizer que isto é de uma injustiça gritante.

Os cínicos —os primeiros cínicos, como os já citados Antístenes de Atenas e Diógenes de Sinope— receberam essa denominação (do latim cynicus, de origem grega, para designar o cachorro) porque mordiam como cães ferozes os hipócritas e os poderosos. O modo cínico de agir é o exato oposto do empregado pelos senhores do Parlamento e dos outros poderes da República brasileira. Aliás, pra onde vão os líderes políticos durante as manifestações de 2013?

Padre Antonio Vieira, no atualíssimo “Sermão do Bom Ladrão”, elogia o cínico Diógenes de Sínope, “que tudo via com mais aguda vista do que a dos outros homens”, quando ele, apontando o dedo para os “ministros da Justiça” que levavam à forca alguns ladrões, “começou a bradar: ‘lá vão os ladrões grandes enforcar os pequenos’”. Quem vive nesta segunda década do século 21 e testemunha toda sorte de gente em busca de interesses inconfessáveis, percebe a justeza e a atualidade dessas frases do bom jesuíta Vieira: austero, inspiradas na conduta cínica.

Os dois filósofos gregos ensinavam que a alma humana é imortal, sendo preciso bem administrá-la, pois a sua estrutura, embora mais elevada do que a do corpo, possui uma enorme fragilidade. O autoconhecimento mostra-se estratégico, bem como a vida em perfeita amizade (“um amigo é uma só alma em dois corpos”). Dentre os empecilhos à boa amizade, ensinam os cínicos, estão a inveja, a lisonja, a ignorância e as humilhações recíprocas. Contra elas, o treino ascético é fundamental. Quem se acostuma a bajular o próprio corpo logo estará apto, na alma, a ser bajulado pelo primeiro inimigo disfarçado.

Mais: a felicidade só pode ser atingida se resultar da mais inflexível justiça e da mais rigorosa liberdade. Não depender dos confortos ilusórios trazidos pela riqueza e pelo mando político é o modo de ser livre e de conquistar a plena autarcia, o domínio sobre si mesmo. Sem ela, a escravidão ronda almas e corpos. Assim falavam os cínicos. Disso resulta a fraqueza da língua.

A palavra livre, segundo os cínicos, é a mais bela das conquistas humanas. Nem preso aos ricos e poderosos nem sujeito à multidão, o verbo consciente recusa a lisonja pessoal e a demagogia. Do cínico Diógenes é a frase célebre: “quando sou aplaudido por muitos, certamente devo examinar-me para saber se não disse uma bobagem”. A liberdade assim percebida se baseia na ascese. A virtude ascética fez o filósofo jogar longe o seu caneco ao ver um menino bebendo da fonte com a palma da mão.

Apenas o necessário à vida, sem luxos, sem pedantismos e sem lauréis. Essa é a doutrina cínica. Os cínicos ajudam-nos, até hoje, a romper com a hipocrisia da fala “politicamente correta”. Tamanha potência da virtude fez o pensador gritar ao poderoso Alexandre: “Desejo somente que não me tires a luz do sol”. Ah, se os nossos governantes e políticos fossem de fato cínicos! Todos os ensinamentos dessa escola resistiriam ao tempo e aos regimes políticos. O prisma negativo que essa escola recebeu foi dado justamente pelos ardilosos donos do poder, político ou religioso. A calúnia perdura até os nossos dias, em proveito dos inimigos da disciplina, da liberdade de atos e palavras e dos que amam a riqueza (sobretudo a pública) para seu conforto e ostentação.

O cão é símbolo, na cultura grega, da amizade política mais nobre. Platão afirma que os dirigentes da República devem ser como os cães: gentis e leais para com os de casa; ferozes contra os inimigos. E o tirano seria como o lobo, que devora os bens dos cidadãos em proveito próprio. Daí a tese de Jean Bodin sobre a tirania: “Tirano é o que usa os bens dos súditos como se fossem seus”. Vivemos em contínua tirania neste país, mesmo hoje, apesar da aparente democracia. Tudo entre nós está invertido e pervertido. A começar pelo tom errado que damos a uma das mais rigorosas éticas filosóficas do Ocidente, a cínica.

Os políticos, donos do poder, lobos, hienas, urubus-ministros e abutres —bestas-feras no dizer de um araponga ilustre da Abin (Agência Brasileira de Inteligência[?])— que dominam o picadeiro da cinquentenária Brasília, se distanciam dos cínicos. Eles são hipócritas e corruptos, amolecidos nos costumes e empachados de riqueza roubada. Se não temos a bravura dos cínicos, pelo menos não aceitemos as calúnias contra eles, que apenas servem para absolver os seus alvos, os relaxados na moral que enodoam as instituições públicas brasileiras.

Vivemos sob um governo que chegou ao poder através de um partido que se arvorava em dono da verdade e administrador da ética; que nos vendeu por mais de vinte anos a idéia de que era possível mudar tudo pra melhorar o País. O jornalista norte-americano Henry Louis Mencken já dizia que “o pior governo é o mais moral. Um governo composto de cínicos é frequentemente mais tolerante e humano. Mas, quando os fanáticos tomam o poder, não há limite para a opressão”. E parece ter toda a razão. O que se vê agora é que os atos daqueles que exercem o poder hoje no Brasil nos fazem pensar que todo homem decente deve ter vergonha do governo sob o qual vive.


E, a propósito das manifestações que agora acontecem no Brasil, é preciso fazer algumas perguntas cínicas: 1) será que a revolta pública dará algum resultado prático e revolucionário?; 2) a quem interessam de fato os protestos? 3) o que fará a presidenta Dilma Roussef, que um dia pegou em armas pra lutar por mudanças?; 4) onde estão os “líderes” políticos? 5) é possível fazer uma revolução sem um líder que guie as massas?

Luca Maribondo

quarta-feira, 5 de junho de 2013

[Como qualquer brasileiro

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Mais do que uma questão jurídica demarcação de terras um problema político. O procurador da República Emerson Siqueira concorda: “falta vontade política para solucionar a questão indígena”.  Para Siqueira muitas são as alternativas para minimizar os efeitos do conflito fundiário em Mato Grosso do Sul, inclusive reparação por titulação errônea de terras. A omissão da União, porém, em enfrentar questão só tem agravado a tensão.

Uma nota do Ministério Público Federal de Mato Grosso do Sul esclarece que “os conflitos fundiários em Mato Grosso do Sul são históricos e resultam de uma série de ações e omissões do Estado brasileiro. Para se entender a tensão do campo, é preciso antes analisar a história de ocupação do Estado, que resultou no esbulho de comunidades indígenas de seus territórios tradicionais e na concessão de títulos públicos a particulares”.

Tudo começou no final da Guerra do Paraguai (1870), quando houve a anexação de áreas que não integravam o território brasileiro. Para garantir a soberania do país na região, a União fomentou a ida de colonos para o Estado de Mato Grosso, propagando a riqueza do solo e a certeza de um pedaço de terra aos colonizadores. Mas eram terras ocupadas por comunidades indígenas, que foram tituladas em sua grande maioria pelo Estado de Mato Grosso e, em alguns casos, pela União a particulares


Em consequência, os índios que moravam nessas áreas foram confinados em reservas indígenas, criadas no século XX, sem respeitar as diferenças étnicas e grupais. Mais: os índios eram praticamente considerados apátridas, não eram nem brasileiros nem paraguaios. Sem defesa, eles aceitaram a situação, mas não sem muita animosidade. Essas reservas constituem, atualmente, o único espaço de terra de que os índios dispõem para viver, cultivar, preservar recursos que garantam seu bem-estar e de sua reprodução física e cultural.

Diz a nota do MPF que, “se, de um lado, os índios lutam pelo reconhecimento e retorno ao território tradicional de que foram expulsos, por outro, proprietários de terra que possuem títulos de boa-fé, outorgados pelo estado brasileiro, não querem perder o valor da ‘terra nua’ ao terem suas áreas identificadas como tradicionais”.

Com a colonização e com outras atitudes, o Estado brasileiro fazia propaganda da marcha para o oeste, ao mesmo tempo em que reduzia a importância dos povos indígenas na questão. Para essa propaganda, contou inclusive com o jogo e o uso da palavra e da língua como apoio político. Na década de 1950, por exemplo, os antropólogos deram a sua mãozinha para prejudicar os indígenas.

Naquela época, a grafia dos etnônimos brasílicos foi estabelecida na 1ª Reunião Brasileira de Antropologia, realizada no Rio de Janeiro em novembro de 1953; segundo esta, os substantivos e adjetivos são invariáveis e grafam-se, no caso dos primeiros, com inicial maiúscula: os Apinayé, os Borôro, a cerâmica kadiwéu etc. Era uma forma velada de discriminar os índios através da palavra. Era como dizer, vocês são brasileiros iguais a nós, mas não tão brasileiros assim.

É a língua a principal forma de união e de integração de um povo, de uma nação. Sem língua, não há comunicação, não há cultura. Os índios brasileiros são, de origem, analfabetos. Têm, portanto, de aceitar alfabeto, língua, linguística, gramática, que lhes são impostos. Ao terem a gramática dos seus etnônimos diferentes dos outros povos do mundo, estão sendo discriminados. Por que ninguém fala os Árabe, os Celta, os Dakota, os Basco etc?

Dia desses escrevi no Facebook que existem muitas motivações para essa questão dos índios no Brasil, mas a maior delas é essa discriminação. E não estou falando da discriminação dos agressores, dos contrários aos indígenas. Estou falando dos defensores, que os discriminam de uma forma velada, disfarçada. Não vou me alongar sobre o assunto aqui, mas os defensores o fazem no momento que os chamam de índios ou de indígenas (palavras que nada têm a ver uma com a outras, a não ser o fato de iniciarem com as mesmas sílabas)

Nós, os povos de origem caucasiana que vivemos no Brasil, os discriminamos quando escrevemos os nomes de suas tribos e etnias com iniciais maiúsculas, com letras de um estranho alfabeto fonético, que fala em caiowa em vez de caiuá, mas não altera o guarani. Isso é uma forma política e linguística de discriminar.

É como dizer:"índio, você é igual, mas eu sou mais igual do que você"... A propósito. Índio é relativo à Índia, Ásia, ou o que é seu natural ou habitante; hindu, índio, índu. Indígena é relativo a população autóctone de um país ou que neste se estabeleceu anteriormente a um processo colonizado, isto é, o contrário de alienígena, ponto final. O resto é uso político indecente da palavra. Os índios moram no Brasil, a língua falada no Brasil é o português. Seus nomes devem ser grafados como os de quaisquer brasileiros.