quinta-feira, 16 de junho de 2011

Como controlar os gastos do serviço público

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De acordo com a Constituição Federal, é assegurado ao cidadão o direito à informação. Isto significa que todo brasileiro tem o direito de saber onde o dinheiro dos impostos (que não são poucos) está sendo aplicado. Esta Casa do Maribondo mostra como fazer valer esse direito, que pouco utilizam, através de dicas para acompanhamento e fiscalização dos gastos de uma prefeitura. Este material foi elaborado pelo Observatório Social do Brasil.

Lista de pagamentos – O mecanismo mais eficiente para iniciar uma verificação nas contas de uma prefeitura municipal é uma lista mensal de pagamentos feitos pela administração, listados um a um, com CNPJ e/ou CPF, os valores e uma breve descrição do que se trata. Uma breve verificação pode identificar empresas suspeitas ou pagamentos suspeitos, e então os documentos são solicitados à prefeitura para verificar as condições que geraram tais pagamentos. O direito à informação é garantido constitucionalmente.

Verificação do cadastro do CNPJ – Empresas, para fazerem negócios com o setor público, precisam estar com o cadastro em ordem junto à Receita Federal. Uma prefeitura não pode fazer pagamentos a empresas que não tenham o seu cadastro em ordem. Para verificar se a empresa está devidamente cadastrada, basta entrar no site da Receita Federal, www.receita.fazenda.gov.br . Uma vez no site, clique em CNPJ, e depois em situação cadastral. Vai aparecer um local para digitar o número do CNPJ, e depois um quadrinho onde se deve digitar os mesmos caracteres que aparecem em um quadro ao lado, para efeito de autenticação do pedido. Verifique se os dados cadastrais batem com os que a prefeitura está informando. Muitas empresas fantasmas adotam o expediente de imprimir em suas notas fiscais frias o número de um CNPJ qualquer, que esteja em dia na Receita. Se não estiverem batendo, há grande chance de que a prefeitura esteja fazendo pagamentos a uma empresa fantasma.

Notas fiscais de serviços – Tente verificar os pagamentos feitos a empreiteiros locais ou não. Isso pode ser verificado também na lista de pagamentos, e depois solicitar cópia das notas fiscais. Notas fraudulentas normalmente tentam descaracterizar o serviço prestado, como por exemplo, serviço na praça principal, ou serviço na caixa d’água, sem discriminar o tipo de serviço efetuado, os materiais utilizados, de tal forma que fique difícil comprovar a sua existência. Serviços técnicos devem ter a sua execução atestada por um engenheiro, antes que a prefeitura possa fazer o pagamento. Se for necessário, fazer perícia nos serviços para verificar o custo dos mesmos. Normalmente para esses pagamentos fraudulentos, deve haver conluio do almoxarifado, ou do responsável por atestar a realização dos serviços.

Compra de combustível – É muito comum a fraude na aquisição de combustível, principalmente naquelas prefeituras que tem sistema próprio de abastecimento da frota. Muitas notas frias são pagas sem que o combustível tenha sido entregue. Ou às vezes a carga é descarregada parcialmente em outro local, e o combustível entregue é apenas uma parte do que está na nota fiscal. Verificar o tamanho da frota e o consumo médio. Verificar se não constam na frota veículos que já foram sucateados, apenas para aumentar o tamanho da frota e com isso poder fraudar a aquisição de combustíveis. Em prefeituras que abastecem em postos de gasolina conveniados é comum acontecer que veículos não pertencentes à prefeitura sejam abastecidos. Verificar os boletos de abastecimento e verificar o consumo de combustível por veículo. Isso pode revelar fraudes no abastecimento.

Merenda escolar – Verificar se as merendeiras estão assinando as notas fiscais de entrega da merenda, e se elas estão conferindo o que está sendo entregue. Fazer uma verificação se o que está sendo serviço está consistente com as notas fiscais cobradas da prefeitura. É muito comum as notas irem direto para a prefeitura, e as escolas e creches não tomarem conhecimento do que está sendo cobrado da prefeitura.

Aluguel de máquinas – È comum haver notas de aluguel de máquinas, às vezes de locais distantes, e essas notas serem totalmente frias. Checar CNPJ dessas empresas, da forma indicada acima, e caso elas não existam, já está configurada a fraude. Caso elas existam, verificar se os serviços foram prestados.

Fraudes na arrecadação – Acontece muito: o prefeito, ou funcionários, receberem o IPTU, ou qualquer outra taxa, e autenticarem em uma máquina clandestina, se apossando dos recursos arrecadados. Como os sistemas de informática da prefeitura são precários, e normalmente são dois ou mais sistemas, um para o controle do tributo e outro para o financeiro, essas fraudes tardam a ser descobertas. É preciso fazer uma verificação nos dois sistemas da prefeitura, e por amostragem, chamar alguns contribuintes para mostrarem os seus comprovantes e verificar no caixa da prefeitura se os recursos foram depositados.

Aquisição de materiais – De propósito, estabelece-se nas prefeituras que querem desviar recursos um caos no almoxarifado. Quanto mais desorganizado melhor para esconder as fraudes. Por trás da desorganização administrativa, muita fraude passa despercebida. Verificar as notas fiscais de fornecimento de materiais, principalmente para construção, e verificar se os foram recebidos pela prefeitura, e onde foram aplicados ou armazenados.

Despesas de gabinete – Por detrás dessa rubrica, é muito comum o prefeito tirar verbas substanciais, pois elas podem ser cobertas por despesas de passagem, hospedagem, transporte, táxis, combustível, refeições, e como é sabido no Brasil, obtém-se em qualquer lugar, notas do valor que for solicitado. Essas notas são apresentadas à prefeitura como despesas de ordem pessoal do prefeito. Solicitar a lista das despesas, e depois a documentação, e checar a coerência e consistência dessas notas. Muita coisa pode aparecer. O prefeito pode retirar através dessa verba, muitas vezes mais do que recebe de salário da prefeitura.

Licitações direcionadas – Verificar quem está ganhando as licitações da prefeitura. Verificar se são empresas formadas recentemente, e quem são os sócios. Verificar a ligações entre os sócios e o prefeito. Muitas vezes laranjas e testas-de-ferro são utilizados para constituir empresas para concorrer a licitações da prefeitura. Verificar a natureza a licitação se é para serviços ou obras, e solicitar cópias dos processos para verificação. Verificar a estrutura dos arquivos, das propostas, e os outros participantes da tomada de preços ou licitação. Não é raro pedir para que “empresas amigas” participem, apenas para legitimar o processo. Verificar detalhes da instituição, assinaturas, retiradas do edital, estrutura do arquivo, certidões emitidas por autoridades, e a consistência das propostas. Muita coisa pode ser descoberta nessas análises.

Contratos com órgãos de imprensa – Uma prática comum, é o uso de contratos com órgãos de imprensa para publicação de atos da prefeitura, que deixam muitas brechas para publicação de matérias de interesse do prefeito. Às vezes o contrato é em aberto, publicar editais, e quando não houver, publicar matérias do interesse do município. E nesse caso o interesse do município na verdade significa interesse do prefeito, e vão sair matérias do seu interesse político. Isso configura compra de propaganda política. As concorrências devem ser feitas pelo preço de tabela do veículo, para o centímetro de coluna ou o tempo da publicidade em tv e rádio. Acontece muito de um jornal dar o preço da coluna mais baixo, mas quando vai cobrar da prefeitura, emite a nota fiscal cobrando centímetro quadrado, o que aumenta em até quatro vezes a fatura. Como há desconhecimento de como verificar isso, ou conluio para executar a fraude, o dinheiro vai para o jornal e depois é repartido entre os envolvidos. Ou então o jornal paga mediante matérias favoráveis ao prefeito, que às vezes são feitas até mesmo dentro da prefeitura.

Desvio de verbas federais – As verbas federais são específicas, que tem uma prestação de contas específica. Como o poder federal fica distante e a comprovação será feita apenas mediante documentação, é comum que as obras vinculadas a essas obras não sejam executadas, no todo ou parcialmente, e a comprovação seja feita mediante notas fiscais frias. Ou então, que haja um superfaturamento grosseiro no preço dos materiais e serviços. Checar custo dos materiais, tais como pedra, areia, ferro, cimento, e as horas de mão de obra etc. Chamar técnicos para fazer perícia nas obras e constatar os quantitativos de cada um desses insumos utilizados na obra. Essas são verbas às vezes mais polpudas, e muito sujeitos a desvios, principalmente se estiver ligada a obras, e também em casos emergenciais, onde há dispensa de licitação.

Contratos de serviços – Uma prática comum no país é a partilha dos contratos de serviços continuados, tipo coleta de lixo, prestação de serviços de eletricidade, hidráulica, manutenções de equipamentos, aluguéis de imóveis, dentre outros. Verificar se os cheques de pagamentos desses valores são nominais e cruzados, verificar como foi feita a concorrência para a contratação, e solicitar uma perícia para avaliação dos serviços se houver suspeita de irregularidades.

Cruzamento de cheques – A falta de emissão dos cheques nominais ao prestador de serviços e o seu cruzamento pelas prefeituras permite que eles sejam sacados em dinheiro no caixa do banco e repassados aos outros interessados sem que os valores transitem pela conta corrente do prestador de serviços, o que facilitaria o rastreio no caso de quebra de sigilo bancário. A falta dessas providências pode ser um indício de que se deseja praticar irregularidades.

Quem recebe os pagamentos em dia? – Se a prefeitura tem o hábito de atrasar os pagamentos aos fornecedores, mas existem alguns que recebem pontualmente, verificar quais são esses que recebem em dia. Normalmente são aqueles que pagam propina, ou nos quais existe a participação do prefeito ou de funcionários da prefeitura. Verificar como é feita a reordenação dos empenhos dentro da prefeitura.

Aquisição de produtos médicos – A prefeitura é normalmente responsável por pronto socorro ou hospital. Uma das fraudes mais comuns é a aquisição de produtos médicos como luvas cirúrgicas, seringas, gaze, medicamentos em quantidades absurdas. A maioria das notas fiscais de aquisição são frias, de empresas inexistentes, ou empresas pequenas pertencentes a quadrilhas que se especializam em fornecer notas fiscais frias para prefeituras. Às vezes vale a pena uma visita física a esses estabelecimentos.

Junte amigos e colegas e mãos à obra na fiscalização do poder público.

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