_A necessidade das inutilidades

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Uma coisa que vivo questionando é como, quando foram e por quem foram descobertas ou inventadas determinadas coisas que existem até hoje. Sempre que falo sobre isso com alguém, uma das primeiras invenções que surgem no papo é a Internet. Mas pra mim, a Internet é fichinha perto de muitos outros inventos muito mais criativos e anônimos.

Alguém poderia explicar como foi que descobriram que tinham que refogar a alcachofra e raspá-la nos dentes com aquele molhinho? Sim, porque um dia alguém começou a fazer isso. Durante anos, talvez séculos, a alcachofra ficou lá no mato, esturricada. E o café? Como alguém teve a idéia de colher os grãozinhos vermelhos, deixá-los secar ao Sol, descascá-los, torrá-los, moê-los, pra finalmente fazer uma infusão muito saborosa e hoje bebida em todo o mundo? Coisa de árabe, o café também intriga. Mais ainda quando se misturou com o açúcar.

Sou fissurado nessas invenções. Pequenos detalhes da criação humana, descobertos por anônimos Steves Jobs da vida.

Que outro exemplo? A pipoca: você já pensou na pipoca? Só um louco colocaria milho dentro de uma panela fechada com óleo fervendo para ver o que aconteceria. Deve ter sido uma criança travessa ou um terrorista-menino muito precóce. Ou terá sido coisa de índio: pipoca tem cara de coisa de índio. O que significa, basicamente que, antes do óleo e das crianças, não havia pipoca.

E o grampo para cabeça? O grampo em si não deve ter sido difícil inventar. Mas quem inventou aquelas duas pequenas bolinhas na pontas, para não ferir a cabeça da usuária, esse sim, um gênio.

Deve ter sido um achado o dia que inventaram o espelho retrovisor nos carros. Dizem que foi um piloto de fórmula um. Até então, o motorista tinha que ir dirigindo e olhando pra trás o tempo todo, apesar dos poucos carros nas ruas. Mas tinham os cavalos. Por falar em cavalo, donde vem a ferradura? Invenção maldosa essa de meter pregos no cascos dos pobres equinos.

O clipes. Quando surgiu deve ter sido um furacão, como foi o fax há alguns anos. Prender papéis com um pedacico de arame fininho dobrado foi um achado. O grampeador morreu de inveja. A cerveja, então!? E olha que a bebida existe desde priscas eras: os antigos egípcios já conheciam e bebiam a cerveja à sobra da Esfinge e das pirâmides.

E aquela fitinha de plástico para se abrir o maço de cigarros? O cigarro é coisa milenar. Já o filtro, não! Um dia puseram em um e a moda pegou. E é possível garantir aos que nunca fumaram um sem filtro, que era muito melhor. Quem foi o primeiro a descobrir que se podia fumar maconha? Deve ter achado um barato.

Quem inventou aquela maquineta que a gente gira e mói a pimenta? E quem foi o primeiro sujeito a colocar pimenta na comida? Deve ter sido o mesmo que gostava de giló.

Ovo frito, vá lá. Mas o cozido já foi curtição que surgiu bem depois. Mas nunca ninguém conseguiu colocar o ovo em pé. Ou será que o Cristóvão Colombo pensou em cozinhar o ovo até ficar duro pra depois colocá-lo em pé?

Vidro, tudo bem. Mas tem um objeto que você deve ter uns dez em casa: o espelho. Só pode ter sido sem querer. Duvido que um dia alguém ficou pensando "vou inventar o espelho para me ver melhor". Uns dizem que foi a inimiga mortal da Branca de Neve. Outros atribuem o fato a Narciso.

Um dia alguém ficou olhando para uma vaca e cismou com as tetas dela e foi lá. Talvez até de sacanagem —tetas de vacas são sugestivas. Deu no que deu: leite A, leite B, leite C e até leite condensado, leite em pó. Coitadinhas das vacas. Leite desnatado, gente. Queijo e manteiga deve ter sido moleza. Já estavam com a faca e o queijo na mão.

E quando será que Adão descobriu que podia colocar aquilo naquilo e que era ótimo? E que Eva achou que receber aqui dentro daquilo? Parece bobagem, mas isso também teve a sua primeira vez. Pensando bem é muita criatividade. Também foi interessante quando o homem descobriu que era responsável pela gravidez das mulheres. Nós somos tão bestas que ficamos milênios sem se tocar que éramos os responsáveis.

Grande invenção o apontador de lápis. Aquele antigo onde você enfia o lápis e gira. Antigamente a gente usava gilete usada dos pais. Geralmente cortava mais o dedo que o lápis.

E o cabide, hem? O ziper também surpreende. O rodo de borracha pra puxar água. A pizza. Esmagar azeitona pra fazer azeite. E o cuscuz, que todo mundo pensa que é nordestino, mas veio de África? 

Já o sádico que inventou o arame farpado foi um tal de Joseph Glidden, em 1874. No velho oeste, é claro. Já o biquini é de 1946, e faz parte daquelas novidades de pós-guerra. Na França, é claro. Depois de tanta resistência...

E o papel que foi em 105 A.C.? E o papel carbono, hoje tão em desuso? Mais velho que o papel é outro invento genial: o sabão. Foram os higiênicos sumérios 2.500 A.C. E não adiantou nada Poncio Pilatos lavar as mãos e esconder o sabão... Todo mundo usa até hoje.

E a camisinha, então? Quem imaginaria um invólucro de plástico fininho pra envolver o pingolim e, assim, evitar filhos e doenças?

Mas existe um bocado de invenções completamente inúteis. Aliás, o mundo é repleto de coisas inúteis, projetadas com a única finalidade de ocupar espaço em estantes, gavetas e armários que não deve ficar vazios.

O canivete suiço, por exemplo. Ninguém, jamais realmente usou todas as mais de vinte opções de coisas que vêm acopladas na geringonça, desde uma simples lixa de unha até uma bomba de neutrons.

A bússola de relógio é outro exemplo de inutilidade. Quem em sua sã consciência confiaria em uma bússola de um relógio digital, que emite um campo magnético? E as coisas que vieram, ficaram e, depois, sumiram, tipo fita cassete, telex, teletipo, linotipo, político honesto y otras cositas mas?

Com a Internet passamos a encontrar cada vez mais coisas inúteis à venda. Volta e meia me surpreendo, ocupadíssimo, a fuçar na rede. Tentando achar algo de útil —além de escrever. Dia desses me deparei com um site português, com uma enorme quantidade de inutilidades. E resolvi navegar pelo site.

Mas por que continuei? Por que, é claro, que nunca sabemos do que vamos precisar logo mais. Não digo amanhã, ou na semana que vem, ou mesmo no próximo mês, mas daqui a dez anos. Quais das coisas que você carrega agora com todo cuidado não se tornarão inúteis com o passar do tempo?

E quais aquelas que você nem percebe e das quais dependerá sua vida anos depois? Essa é a nossa principal diferença, e desvantagem, em relação aos heróis e personagens de contos maravilhosos: eles sempre levam apenas o que precisam, e possuem alguma espécie de cinto de utilidades em que guardar, já prontas para serem usadas, as armas necessárias para chegar ao final da aventura.

Depois de escrever isso, fiquei pensando em como necessitamos cada vez mais de coisas inúteis na vida. E aí, minha mente se torna radical, isto é, pensa no outro extremo: tudo é inútil, inclusive dizer isso.