sexta-feira, 22 de outubro de 2010

_Pra desorientar

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Com certeza uma das principais atrações da campanha eleitoral de 2010, as pesquisas eleitorais são execradas e idolatradas, dependendo do lado em que estão e em que posição se encontram candidatos e seus correligionários. As pesquisas de intenção de voto têm cumprido uma dupla função desde que existem —a primeira pesquisa eleitoral feita no Brasil foi divulgada em maio de 1945: era a primeira eleição presidencial depois de 15 anos da ditadura de Getúlio Vargas.

De um lado, esses levantamentos de opinião funcionam como instrumento de investigação da realidade, capaz de informar eleitores, políticos, partidos, orientando-os em suas decisões. De outro, acobertadas pela imagem de trabalho científico, elas têm sido usadas para desinformar a opinião pública, visando a manipulação do voto. Mas como avaliar os resultados muitas vezes contraditórios que costumam ser publicados, para não ser enganado? Os especialistas no assunto costumam analisar os resultados tendo alguns cuidados básicos.

Um desses cuidados é estar sempre atento aos dias em que as entrevistas foram feitas. Dependendo da agilidade do instituto e dos interesses de quem pediu o levantamento, entre a coleta dos dados e sua divulgação podem passar de um a dez dias ou até mais. De acordo com o que acontecer nesse períodoum debate entre os candidatos na televisão, o surgimento de alguma denúncia escabrosa, uma simples bolinha de papel — ao ser publicado o resultado pode estar "velho", devendo ser relativizado

É sempre bom analisar a amostragem da pesquisa. Não é raro se descobrir que um levantamento apresentado como nacional refere-se a uma pesquisa feita apenas em alguns Estados ou regiões, ou em capitais e regiões metropolitanas. Em se tratando de eleições presidenciais, nada mais falso. Não se faz uma boa amostra eleitoral hoje no Brasil, que conta com mais 5,5 mil municípios e possui quase 136 milhões de eleitores, em menos de cem cidades, distribuídas em todos os Estados e com eleitorados de todos os tamanhos.

A formulação das questões aplicadas aos entrevistados é outra questão fundamental. Além do risco de perguntas enviesadas, em qualquer momento de um processo eleitoral as respostas de intenção de voto espontâneas serão muito diferentes —e portanto incomparáveis— das respostas estimuladas por listas de candidatos.

É preciso conferir as credenciais de quem elabora e concretiza a pesquisa e os propósitos do cliente, ou seja, quem paga pelo serviço. Quem analisa as pesquisas tem de saber qual o instituto que assina a pesquisa e quem a encomendou. Qualquer pessoa ou grupo tem o direito de fazer e divulgar pesquisas eleitorais. Tanto a qualidade técnica de um levantamento como o compromisso com a verdade dos profissionais nele envolvidos precisam ser comprovados. Ao tomar conhecimento de uma pesquisa eleitoral, o eleitor tem de se informar sobre que instituto a fez e qual seu desempenho em eleições anteriores.

E não se pode esquecer que muitas dessas empresas fazem pesquisas estapafúrdias muito antes das eleições e depois as acochambram quando se aproxima o pleitopor isso, em geral os resultados das eleições estão de acordo com as pesquisas. Além disso, é bom checar quais são os vínculos de interesse entre quem fez e quem pediu a pesquisa, e qual dos dois a está divulgando. Uma pesquisa eleitoral encomendada por um candidato será publicada se for do seu interesse, merecendo por isso ser lida com muita precaução.

O grau de isenção na divulgação de uma pesquisa, por sua vez, depende diretamente do grau de independência do meio de comunicação em relação aos políticos envolvidos. Muitas vezes esse grau é igual a zero: o político bem avaliado ou em ascensão é parente próximo, ou parceiro econômico em outros empreendimentos, quando não o próprio dono do veículo divulgador da pesquisa. A atenção tem de ser redobrada.

O cidadão tem de ver o resultado da pesquisa com seus próprios olhos. Tem de aprender a ler os dados. Dado que mesmo entre os poucos veículos de fato independentes, a objetividade jornalística é uma utopia que nunca se realiza plenamente, recomenda-se aos telespectadores de todos os canais e aos leitores de todos os jornais que aprendam a ler os dados —as tabelas, os gráficospor si mesmos. Esse é o único antídoto para não ser levado por interpretações distorcidas. Feito isto, o eleitor tem de exercer depois uma leitura crítica da interpretação que costuma acompanhar as pesquisas eleitorais e tirar as suas próprias conclusões.

Mas e se o resultado de um levantamento for divulgado sem as informações necessárias para seguir as recomendações indicadas acima? Bem, neste caso, de três, uma: 1) houve um descuido, tendo se descumprido tanto a legislação eleitoral como o código de ética que regula as atividades dos institutos de pesquisas de opinião e mercado; 2) a ocultação de um ou mais desses dados foi deliberada, visando impedir uma avaliação correta do resultado da pesquisa para beneficiar ou prejudicar um ou mais candidatos envolvidos; 3) a pesquisa que o candidato jura ter no bolso do colete, colocando-o à frente dos demais, indicando que vencerá no primeiro turno, ou que seu adversário está despencando, se é que existe, foi tão "encomendada" que não passa por uma comparação crítica com outros levanta¬mentos disponíveis.

Portanto, qualquer que seja o caso, na ausência de informações recomenda-se prudência. Senão, poderá ser enganado ou usado. Ao contrário do que imaginam alguns, a melhor maneira de controlar o mau uso de prévias eleitorais não é proibindo a divulgação, mas garantindo sua multiplicidade. A proibição apenas agravaria o desnível de informação entre os eleitores e os candidatos, que seguiriam encomendando seus próprios levantamentos. a proliferação de pesquisas eleitorais, apropriadamente divulgadas, permite ao leitor compará-las e tirar suas próprias conclusões.

Particularmente, penso que a gente nunca deve confiar plenamente nas pesquisas —os resultados do primeiro turno das eleições de 2010 provaram esta asserção. Muitas das falhas dos resultados, porém, não são devido a erros dos levantamentos —acontece que os institutos de pesquisas utilizam-se de métodos absolutamente técnicos e científicos. Mas o povo teima em votar sem o uso de qualquer tecnologia. Até porque, hoje as pesquisas eleitorais estão sendo feitas pra desorientar o eleitor.

Luca Maribondo

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