domingo, 4 de junho de 2017

O palhaço da política

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Barbara Maria Vallarino Gancia, 59, é jornalista. Foi colunista da "Folha de S.Paulo" até 2016, apresentadora do programa "Saia Justa", da GNT. Filha de Piero Gancia, ex-piloto de corrida de automóveis e primeiro campeão brasileiro de automobilismo. Faz uns dias, em seu perfil no Facebook, a sra. Gancia resolveu trolar a indignação seletiva dos sectários do senador interrompido Aécio Neves e daquilo que ela chama de antipetismo em geral. Num copioso rol de treze pontos, analisa posturas de quem apoiou o impeachment da presidente interrompida Dilma Rousseff, mas que, segundo ela, nunca foi contra a corrupção.

Para Bárbara Gancia os eleitores do dr. Neves comportam-se como salafrários: I) "Não sou nem de esquerda, nem de direita, sou pelo Brasil!" —é de direita; II) "Não tenho partido, meu partido é o Brasil!" —vota no PSDB; II) "Quero que a corrupção seja combatida no PT, PSDB ou PQP!" —quer que a corrupção seja combatida apenas no PT. No perfil pessoal, só tem publicações contra o PT. Contra o PSDB ou PQP, nada; "IIII) Não sou coxinha nem petralha, sou brasileiro!" —é coxinha; "Quero meu país livre da corrupção!" —vota em Alckmin há 15 anos; VI) "PT gosta de sustentar vagabundo!"—perdeu a escrava doméstica e tá tendo que lavar os pratos; VII) "PT dá casa pra vagabundo!" —é proprietário de várias casas para alugar e estão encalhadas; VII) "Estou indignado com tanta corrupção!" —segurou o cartaz 'Somos milhões de Cunhas'; IX) "Nenhum político presta!" —é analfabeto político; X) "Tempos bons eram os de FHC!" —é patrão e não paga direitos trabalhistas nem tira nota fiscal; XI "Não sou de direita, mas tem que tirar essa vagabunda do poder!" —votou em Aécio e está com o avatar de Bolsonaro na foto do perfil; XII) "O PT não ensina a pescar e ainda rouba os rios e o anzol!" —é fã de Lobão, assina a Veja, assiste e ri com Danilo Gentili, e publica 'pensamentos' de Arnaldo Jabor; XIII) Não bato panelas contra partido A ou B, mas contra a corrupção!" —tem que bater uma panela de pressão na própria cabeça.

Não é difícil tomar tento de que o texto é eivado de sectarismo, preconceito e intolerância lulopetistas. Resumindo, dona Bárbara tenta demonstrar que quem é contra o ex-presidente Lula da Silva e seu Partido dos Trabalhadores (PT), que ora no catecismo da pseudo-esquerda, é da extrema-direita empedernida e a favor da corrupção. Pra ela, ser de direita é ser a favor da corrupção; como se houvessem corruptos de esquerda.

É bem provável que, entre a esquerda e a direita, melhor ficar com a esquerda. Esta prega um modo mais generoso de vida, de defesa dos fracos contra os empoderados ­—não há, porém, anjos em nenhum dos lados. Mas os seguidores da sinistra (vocábulo aqui usado como sinônimo de esquerda) têm uma deficiência estúpida: o exercício de julgar o outro por suas ideias. Para os lulopetistas e esquerdistas de modo geral, quem não reza pelo seu breviário é um ser ignominioso. Ideias e ideologias têm importância extrema. Mas não é apenas isso. Existem canalhas desabotinados que são esquerdistas de alto coturno. O que torna um indivíduo melhor não são apenas suas ideias; mas seus sentimentos e seu comportamento, sobretudo a forma com que trata seus semelhantes.

Desde meados da década de 1990, Pindorama é governada por um partido dito de esquerda, PSDB e PT um após o outro —este último curiosamente com um nome e conceito semelhantes aos do Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães, mais conhecido internacionalmente como Partido Nazista. Muita gente, porém, criou a mistificação de que o PT é o antônimo da ditadura militar (1964/1985). Não é.

Os dois, PT e ditadura, buscaram reduzir as diferenças sociais através de programas e projeto, não com mudanças de sistema. Ambos, PT e ditadura, foram desenvolvimentistas, através de programas de redistribuição de renda. No governo militar, a mídia foi censurada. O PT buscou a censura através de um hipócrita "controle social da mídia". O PT e a ditadura de 1964 foram são estatizantes, os dois apostaram na indústria automobilística como pilar de desenvolvimento e tiveram seus empresários-modelo, em ambos os casos financiados pelo BNDES.

Lula da Silva aproveitou o bom momento econômico internacional e fez o Brasil crescer até 7 ,5% num ano. Semelhante a Emílio Médici, um general-presidente, levou o país a 10%. Depois de Médici, assim como depois de Silva, a economia virou. Seus sucessores, Ernesto Geisel e Dilma Rousseff, tiveram de enfrentar momentos delicados e um país em princípio de ruptura social. Sarney e Maluf, velhos próceres da Arena/PDS, o partido da ditadura, foram eleitores entusiasmados do PT —embora Maluf, agora condenado, reclamasse que o PT estava à sua direita. E por aí vai...

Esquerda e direita no Brasil são gêmeas univitelinas. Mas nem a esquerda nem a direita aproveitaram seus bons momentos para fazer reformas estruturais. E o Brasil mais degenerado torna-se como nação. Nas gestditadura e nas gestão do PT, o país melhorou para milhões de indivíduos; piorou como nação. Foram medidas paliativas, não curativas. Não mal-intencionadas, mas com vontade de realizar o melhor, mas que deram em nada por falta de vontade política.

Madame Gancia demonstra sobeja e claramente a filosofia política do lulopetismo —disseminada por toda a esquerda brasileira— de não admitir inteligência, cidadania, decência fora do PT. A nação seria muito mais justa e decente se todos compreendessem que tanto à destra quanto à sinistra há quem queira que no Brasil todos —absolutamente todos— tenham iguais direitos e obrigações. Ou seja, todos tenham o favor da cidadania e da justiça.

Atual momento político do Brasil demonstra que há ratos que decididamente decidiram-se por não abandonar o navio, mesmo que este esteja naufragando. Imaginam poder encontrar um tesouro submerso. A estupidificação humana é o momento em que se convence de que a concentração de poder tem unicamente por fim à manipulação dos cidadãos, pela necessidade de uma pretensa ordem social de que o ser humano necessita. Não fosse assim, ainda hoje os humanos seriam neandertais dormindo na areia em cavernas. Quem não chegou a esta fronteira de pré-loucura jamais identificará a manipulação diária de que é alvo. E quem sabe manipular a sociedade cria o fanatismo.

É horrível observar que as mesmas pessoas que criticam os outros sem o menor pudor, sem resquícios de constrangimento, são essas as mesmas pessoas que não filtram suas palavras, e que são as mais sensíveis quando recebem críticas. É o ser que despeja no outro aquilo que não suporta que seja despejado em si próprio. O excesso de crítica é o modo mais eficaz de exterminar qualquer relacionamento.

Barbara Gancia é uma defensora sectária das chamadas esquerdas. E escreveu sua lista como uma fanática. Pelo seu texto deduz-se que nunca se deve discutir com um fanático, até porque eles não são de compreender e aprofundar os argumentos de uma discussão. Pior, os fanáticos não compreendem que em qualquer altercação há outras alternativas. Despropositado, o fanatismo impede o indivíduo de ser racional.

Os fanáticos agem instintivamente, são cegos e não percebem a realidade. Não aceitam o contraditório, e diante do conflito reagem com estupidez quando são confrontados. O fanático adora os seres que consideram superiores, sejam guias, líderes, mistagogos, condutores, mentores, mestres, santos, deuses. Por isso, é quase impossível encontrar um fanático confesso —fanáticos nunca admitem seu próprio fanatismo. O fanático é o palhaço da política...

Friedrich Nietzsche observou que "homens convictos são prisioneiros." Tem um bocado de gente convicta vivendo em prisões virtuais —são prisioneiros de suas próprias mentes, trancafiadas pelas limitações impostas por si mesmas, vivendo com a miséria, a ignorância, a ruína. São, não por burrice ou ignorância, mas por memória congênita, prisioneiros do julgamento dos seus semelhantes. Temem outras alternativas que não sejam as já analisadas, testadas e comprovadas. Os criativos constroem caminhos, dão origem a opções, proclamam a própria independência, enquanto os outros vêm atrás disputando o troféu de melhores ou piores em reprodução.


Luca Maribondo
Campo Grande | MS | Brasil




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