Num bar de Varginha que atende
pelo singelo nome de “Pinga com Torresmo” o acordo foi firmado. Bruno foi
tratado como celebridade em Varginha; o Boa
Esporte virou assunto no Brasil inteiro. Os e as fãs logo souberam do encontro e
passaram a correm atrás da celebridade sanguinolenta.
Muita gente fala em
reabilitação e defende o ex-flamenguista assassino Bruno, que sempre alegou
inocência, mas nunca lamentou a morte de Elisa, nunca lamentou pela criança que
ficou sem mãe, nem lamentou pelo sofrimento de sua família. Nem nunca pediu
perdão. Bruno pensa participou de algo corriqueiro e que ficar preso não muda
nada. A tradução é a seguinte: o crime compensa. E compensa com a conivência da
justiça. Porque se a justiça fosse séria ele ficaria trancafiado durante 22
anos.
Me perdoe oleitor por retornar
a este assunto desagradável, mas isso tudo me veio à mente na manhã deste idos
de março, uma quarta-feira, quando vi a primeira página de uma folha local, o
jornal O Estado do MS, que exibe uma
foto de crianças pedindo autógrafos ao atleta mineiro. Lembrei-me também de “O Manual
da Barbárie”, ensaio do historiador britânico Eric Hobsbawm, que é a
transcrição de sua conferência sobre anistia proferida no Sheldonian Theatre, em
Oxford, em 1994.
No livro Sobre História, onde li o ensaio, Hobsbawm diz que “intitulei minha
palestra como ‘Barbárie: manual do usuário’ não porque deseje apresentar
instruções sobre como ser bárbaro. Ninguém de nós, infelizmente, precisa disso.
Barbárie não é algo como dança no gelo, uma técnica que precisa ser aprendida —pelo
menos, não até que se deseje tornar-se torturador ou algum outro especialista
em atividades desumanas. Trata-se antes de um subproduto da vida em determinado
contexto social e histórico, algo que vem com o território, como diz Arthur
Miller em ‘Morte de um Caixeiro-viajante”.
Mais adiante, o historiador
argumenta que “esclarecerei a primeira forma de barbarização, a que acontece
quando desaparecem os controles tradicionais. Michael Ignatieff (político, escritor,
historiador, jornalista e professor de História canadense), em seu recente ‘Blood
and Belonging’, observa a diferença entre os pistoleiros das guerrilhas curdas
de 1993 e os dos postos da fronteira bósnia. Com muita perspicácia, ele percebe
que na sociedade sem Estado do Curdistão todo menino que chega à adolescência
recebe uma arma. Portar uma arma significa simplesmente que o rapaz deixou de
ser uma criança e deve se comportar como homem”.
Ver imagens de crianças pedindo
autógrafos ao assassino condenado teve mais ou menos o mesmo significado para
mim. Quer dizer, um assassino deve ser venerado, sim. Mesmo que seu crime tenha
sido cometido de forma cruel e sanguinária. A atitude com relação a Bruno
Fernandes demonstra que o crime compensa, né?! Testemunha e participantes
disseram, à polícia, que Samudio foi esquartejada e enterrada. Outros
acrescentaram que a moça foi dada como refeição a cães da propriedade rural do
ex-ex-goleiro.
No Brasil, o meio esportivo é
tão corrupto quanto o ambiente político. O que torna natural a louvação do Monstro
de Varginha, que é a demonstração acintosa de que a barbárie é perfeitamente
aceita entre uma grande parcela de brasileiros. Cometer um crime horrendo é uma
ação perfeitamente aceita no seio da sociedade. Bravo, senhor monstro. Bravo, senhor
Monstro de Varginha. E crianças aprendem com os adultos.
Luca Maribondo
Campo Grande | MS | Brasil
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