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Cheguei
em Campo Grande em 25 de setembro de 1972, vindo do interior de São Paulo —há
exatos quarenta anos, portanto. Havia completado 25 anos três dias antes e aqui
cheguei em plena campanha eleitoral daquele ano. Naquela época, em plena vigência
do governo militar, havia apenas dois partidos políticos. Arena, acrônimo de
Aliança Renovadora Nacional, agremiação governista, e MDB (Movimento
Democrático Brasileiro), oposição permitida, uma contradição em termos que
permanece até os dias de hoje, com a denominação de Partido do Movimento
Democrático Brasileiro, ou PMDB.
Levy
Dias, bacharel em direito, evangélico, líder estudantil, era o candidato da
Arena; não me lembro quem foi o candidato emedebista, se é que houve algum.
Contados os votos —naquelas priscas eras o voto era em cédulas de papel e
contados uma a um—, Dias ganhou. O apoio do venerando cacique da política
mato-grossense do passado Pedro Pedrossian foi decisivo.
Com
os dias contados, os 14.619 em que cá estou, nunca vi uma campanha eleitoral
tão relés, tão sórdida. Também nunca vi, nestes pouco mais de 487 meses, grupo
de candidatos tão néscio quanto o septeto que disputa nossos votos obrigatórios
neste 2012. Um septeto maldito. Não vou aqui analisar a postura de cada um, nem
a ação coletiva dos candidatos, inclusive os que pleiteiam uma vaga de
vereador. Pretendo apenas dizer por que devo anular meu voto.
É
isso: pretendo anular o meu voto no primeiro turno das eleições municipais de
sete outubro. Não dou certeza porque não posso controlar o desenrolar dos fatos
e apenas os cretinos não mudam de ideia diante das mudanças ambientais e
comportamentais. Penso que devemos ser rígidos com os princípios, com a
filosofia, não com algo efêmero como as ideias, os desejos e as vontades.
Mas
voltando ao voto, tenciono anular meu sufrágio porque tenho plena certeza de
que nenhum dos sete candidatos deve administrar minha cidade —minha não só
porque aqui cheguei faz quarenta anos, mas porque aqui nasci 25 anos antes de
aqui voltar. Meus motivos são muitos: alguns por inépcia, por despreparo, todos
por questões ideológicas e por desvergonha. Não tenho provas nem evidências
contra nenhum deles, mas não acreditaria nem num "Pai Nosso" puxado
por um deles.
Sou
anarquista por natureza e por opção, assim não me sinto representado por
nenhuma facção política; uns poucos políticos de extrato nacional e
internacional se aproximam desse ideal, mas são cada vez mais raros —quiçá
inexistentes nos dias de hoje. Nenhum dos candidatos à prefeitura da minha
cidade defende os princípios que tenho como de valor. Pelo contrário. Todos
prometem aumentar ainda mais o poder do Estado, dando mais e mais força para o
Governo se meter nas nossas vidas. Todos falam em mais impostos e taxas, em
câmeras de vigilância, em polícia; mas ninguém diz nada a respeito de
cidadania.
Minha
decisão nada tem a ver com a chance de conseguir uma nova eleição devido ao
grande número de votos não válidos. Nem tenho certeza se existe esta
possibilidade na nossa Constituição, mas já vi gente defendendo que “sim, se a
maioria votar nulo ou branco teremos novas eleições sem os atuais candidatos”,
mas vi juristas dizendo que “não, não é possível esta interpretação”. De
qualquer forma, a “anulada” que darei nas máquinas de votar (vulgar e
erroneamente conhecida como urna eletrônica) no dia 7 de outubro nada tem a ver
com isso, repito.
Penso
em anular o meu voto porque todos os sete candidatos propõem medidas que vão
aumentar o poder e o alcance do governo e na mesma medida diminuir a responsabilidade,
o direito e a liberdade do cidadão. Todos que pedem meu voto são burocratas
moldados pelo “politicamente correto” e, saibam ou não, estão a serviço de
forças espúrias e obscuras, forças estas que se alimentam da burocracia e
cresce no vazio deixado pela recusa das pessoas em defender a cidadania e a
justiça. São as pessoas que moram na cidade que permitem existência dos
candidatos que os poderosos nos impingem.
É
fato que, ainda hoje, existem indivíduos que fazem tudo o que querem fazer neste
país (e não me referindo apenas a políticos), sem temer a justiça, sem se
preocupar com o dever de seguir as leis (que, diga-se de passagem, passaram a
ser elaboradas por um grupo de sujeitos que são escolhidos diretamente por nós,
é verdade, mas, que geralmente frustram muitas das nossas expectativas.
Votar,
no Brasil, por enquanto não faz tanta diferença. É dura essa realidade. Há quem
não concorde com essa afirmação, contudo. Penso que seja por alguma razão que
obstrua a clareza da consciência das pessoas. É o futebol que cega o povo? É
religião (qualquer delas) que nos corrompe a mente? O carnaval? O sexo? O
anseio de resolver a sua vida individual, independente de considerar que há
miséria em vidas alheias? É a alienação? É a falta de educação? O medo? A
preguiça? A ignorância? O que é que deixa o povo cego, afinal?
O
Brasil irá para frente quando o povo for para as ruas pra reclamar, pra
destruir os impérios particulares erguidos com verba pública, pra exigir
respeito, honestidade, decência. E fazer isso, companheiro, sem ter tido uma
educação de qualidade, é bem difícil. Muitos nem sabem que podem causar
transformações importantes, desconhecem a força que têm. Se conseguíssemos nos
organizar pra cobrar o que nos é devido. Mas, sem nos politizarmos, permaneceremos
coletivamente fragilizados.
As
pessoas podem escolher os seus candidatos, mas, devem ter cuidado pra não votar
com a emoção. Eu escolhi votar nulo. Não vou, simplesmente, me satisfazer com
aquilo que colocam como opções para um eleitorado insensível e ignorante, pois
sei que existem melhores opções do que essas que costumam lançar candidaturas.
Opções que sequer foram oferecidas ao povo, ainda. Tudo muda, mas só nós temos
o poder de mudar.
É
uma esmagadora minoria que consegue distinguir o que as relações de poder —soma
de dinheiro e política— têm causado no mundo nos dias de hoje. São poucos os
que se preocupam com isso. Alguns se importam principalmente com escolhas que
possam atender mais e melhor aos seus interesses pessoais, deixando o
comunitário de lado. Eu estou desejando a mudança que quero ver no mundo —um
mundo de todos, sem exploradores ou explorados. Integração humana. Plenitude da
consciência. Transformação urgente e necessária. Verdade, e não mentira. Por
isso tudo estou pensando em votar nulo.
É
preciso pensar como um herói pra se tornar um ser humano decente. E, como diz o
corolário do meu irmão Geraldo Maribondo, "e para ser um ser humano
decente é preciso agir como herói". Não há espaço pra covardia.
Luca Maribondo
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