sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Não encha o saco!

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Todos os dias é possível ler, ouvir e ver na mídia o variado noticiário sobre o trânsito da cidade. De maneira geral, as notícias não são boas: mortos e feridos protagonizam o noticiário. Quase sempre o que se narra é a batida, o atropelamento, o acidente com algum motorista, motoqueiro ou pedestre estendido no chão.

Campo Grande é uma cidade em que você acorda pela manhã e sabe que até o início da noite que alguém vai morrer ou se ferir em acidente de trânsito. Esta é a cidade de Campo Grande, bárbara, desumana, mal administrada, perversa, a grande cidade limpa de Campo Grande repleta de lixo em todas as sarjetas e esquinas do centro.

Embora a questão do trânsito seja um dos principais desafios de Campo Grande, está se falando também de uma cidade caindo aos pedaços, principalmente no centro, cheia de buracos, crateras, sujeira, uma cidade que privilegia o transporte individual e despreza o coletivo. Uma cidade carente de praças e parques, sem falar da falta de arte nas ruasonde estão os monumentos? As principais ruas e avenidas com o pavimento em péssimas condições. Uma cidade sem saída. Uma cidade desumana.

Haja vista que toda intervenção do poder público altera sobremaneira a vida dos cidadãos. Isso pode ser facilmente verificado com as inúmeras obras viárias —como tal orla (orla sabe-se do que) morena e os chamados parques lineares que a Prefeitura realizou nos últimos meses. São obras que realmente mudam a cidade, mas passam ao largo da humanização.

Na segunda metade da década de 1970, o prefeito Marcelo Miranda tascou na sua administração o conceito de humanização da cidade, na tentativa de convencer os cidadãos da necessidade de humanizar Campo Grande. O conceito se consubstanciou no slogan "por uma cidade mais humana".

Miranda, que na época chegou a trazer o engenheiro e urbanista Jaime Lerner, ex-prefeito de Curitiba, sequer chegou a completar seu mandato, tendo isso nomeado governador do Estado, e a idéia da humanização foi abadonada. Seus sucessores, sem exceção, simplesmente se esqueceram do conceito de humanização.

É um desafio e tanto o de inverter a perversa lógica que dominou o desenvolvimento das cidades nos últimos quarenta anos. É um desafio mudar as coisas na Morenópolis devido a muitas razões. Até porque muita gente está convencida de que uma delas é que nada precisa mudar. Prevalece o mito de que tudo está bem assim como está.

Aliás, a ordem tem sido de elogiar a cidade. Com o apoio e o aplauso da mídia de maneira geral, a ordem é dizer que é bela. Que é florida, verde e sua natureza, exuberante. Que sua gente é ordeira, educada e limpa. Além de bonita, saudável e feliz. Que recebe visitantes de braços abertos. Que, enfim, é diferente. A interpretação é a seguinte: esta cidade não precisa mudar.

Mas, uma cidade não é, sempre, muitas cidades? Não há, sempre, um pouco de cada uma das cidades invisíveis de Ítalo Calvino (in "As Cidades Invisíveis") em cada cidade real? Então: é possível defender que a Morenópolis é diferente? Que não precisa mudar? Será esta a verdade ou Calvino está certo quando afirma que "jamais se deve confundir uma cidade com o discurso que a descreve"?

De fato, a maioria da gente que nela vive é simples, humilde e trabalhadeira. Outra parte, entretanto, tem nariz empinado e é esnobe, arrogante e preguiçosa. E nem se trata daquela preguiça boa, dos índios. Trata-se da de quem suja, mas manda os outros limparem. De fato, a paisagem urbana é aprazível. Ainda. Porque a especulação imobiliária vai devastando, aceleradamente, o que resta de natureza. A urbe é cada vez mais asfalto e concreto. E cada vez menos paisagem aprazívelisto é: riachos  limpos (estes estão poluídos desde priscas eras), ar respirável, árvores.

Na verdade, a cidade é bela pra poucos, para a minoria de esnobes. Para os que preferem carros, luzes e shoppings. Não para quem paga tarifa elevada de ônibus e mora distante do local de trabalho. Aliás, não para quem trabalha.

Para a maioria dos moradores, principalmente dos bairros periféricos, a cidade não é mais humana —e isso faz é tempo. Isso, porém, não importa para a minoria que manda os outros, a maioria, limparem a sujeira que fazem. A seu modo, humanizam a cidade. Subtraindo mais umas árvores. Limpando, esteticamente, fachadas de shopping e expelindo, higienicamente, ambulantes. Escondendo as favelas.

Em resumo, compreendia uma série de ações para tornar esta urbe mais aprazível, organizada, menos opressora e desagradável aos sentidosEnfim, mais humana. A despeito dos compromissos, reconheço com inevitável tristeza que a Morenópolis continua profundamente desumana. As ruas são sujas e maltratadas, o patrimônio histórico é desprezado, a cidadania é achincalhada, córregos, riachos e suas nascentes são poluídos, as poluições sonoras e visuais ultrapassaram todos os limites. E os cidadãos mandaram aas favas o respeito.

Cada um acha que tem mais direito que o outro, seja no trânsito, nas filas, nos estacionamentos ou nas repartições. O poder público não organiza nem planeja. Ao contrário, executa suas ações em resposta às demandas imediatas, de afogadilho, no grito. O resultado é uma cidade que não garante o bem-estar das pessoas. Não existem boas áreas de lazer, as praças são poucas e abandonadas. Nota-se claramente que nãoum tratamento prioritário para a questão da qualidade de vida, expressão usada a três por dois nos discursos e publicações oficiais.

É uma pena que o “governar pensando nas pessoasnunca tenha passado de promessa vazia entre os dirigentes morenopolitanos. Administrar o Campão com foco no ser humano implicaria em proporcionar espaços públicos de lazer e convivência, como existem em tantas outras cidades. Algumas até menores, mas certamente mais aprazíveis.

anos se fala num projeto de reestruturação urbana e mobilidade no âmbito do centro de Campo Grande. Mas nada do projeto sair do papel.

passou da hora de discutir o projeto com toda a população e propor um desafio aos administradores da cidade: ampliar e consolidar os laços entre prefeitura, universidade, entidades da sociedade civil, ongs, mídia e realizar a partir de 2011 oficinas permanentes nas quais estudantes, professores, técnicos municipais e a população em geral se debruçarão sobre as diretrizes urbanísticas, projetos e ideias para o futuro da cidade, propondo soluções de desenho urbano contemplando desde novas praças e parques até a humanização da cidade, sinalização, arborização e mobiliário urbano.

O mais importante é garantir que toda essa energia esteja a serviço da construção e consolidação de uma ideia: a humanização da cidade. Humanizar significa inverter a perversa lógica que dominou o desenvolvimento das cidades nos últimos quarenta anos, tendo o carro como ator principal.

Antes que seja tarde, precisamos perceber que a solução para as cidades não está em criar mais ruas, viadutos, estacionamentos e espaços aos carros, deixando as cidades feias, poluídas e inviáveis. Carro é sinônimo de paralisia, deseconomia e estresse.

Uma ideia a ser construída pela mídia, empresários, universidade, políticos e cidadãos: a cidade sustentável se estrutura a partir de meios de transporte saudáveis, eficientes e ecológicos, prevendo densidades altas e concentrando moradia, trabalho, estudo e lazer num mesmo lugar para que as pessoas possam circular a , de bicicleta e através de sistemas integrados, eficientes e baratos de transporte coletivo. O futuro é das cidades sustentáveis, independente de seu tamanho ou localização.

Será, porém, que é isto que o morenopolitano deseja? Principalmente, será que a administração municipal deseja mesmo a participação do cidadão na formulação das políticas públicas? A postura dos governantes demonstra ser exatamente inversa: não venha dar palpite na vida da cidade —pague a taxa do lixo, a iluminação pública, o IPTU, o ISS, o IPVA, o IR e as dezenas de impostos e taxas da cidade, do estado e do país e não encha o saco!

Luca Maribondo

2 comentários:

Bruna Andrade disse...

Boa tarde caro colega crítico político, se assim posso chama-lo...
Muitas pessoas não aceitam que suas teses sejam contestadas, outras acham isso muito bom, pois assim mostra a diversidade de opiniões e expõe o outro lado da moeda.
Espero que você seja receptivo, pois se coloca algo para que o público veja, deve aceitar opiniões, pois se não aceitasse, não o publicaria.
Enfim, primeiramente gostaria de elogiar sua retórica. Belas palavras. Porém, apesar de ter uma excelente escrita, quando se analisa o fundamento do texto, senti uma coisa meio incompatível.. Ou seja, parece que foi pego um texto de um escritor muito bom, e preencheu com o nome da cidade.
Me desculpa, mas essa Campo Grande na qual você se refere, não pode ser a capital do MS no ano de 2011. Quem sabe em 2020 pode estar assim. Ou quem sabe eu não conheça a Campo Grande certa!!
Me dê a licença de contestar um parágrafo seu.
" Uma cidade carente de praças e parques, sem falar da falta de arte nas ruas —onde estão os monumentos? As principais ruas e avenidas com o pavimento em péssimas condições. Uma cidade sem saída. Uma cidade desumana."
Vamos lá, "uma cidade carente de praças e parques" Pro seu governo, o Parque das nações Indígenas é considerado um dos maiores parques dentro de um perímetro urbano DO MUNDO, com uma extensão de 119 hectares. Oferece infra-estrutura adequada para a prática de lazer, diversão e esporte. Dispõe de quadra de esportes, pátio para skate e patins, sanitários, pista asfaltada para caminhada de quatro mil metros, lanchonetes, policiamento e um grande lago formado próximo à nascente do córrego Prosa (dados extraídos de um site qualquer)
Além do parque das nações indígenas, também temos o Parque ecológico do Sóter, projetado como parque modelo, dispõe de área verde com 22 hectares, quadras poliesportivas, pista de skate e patinação, pista de cooper, ciclismo e etc...
Ah, não podemos nos esquecer do parque do Itanhangá, é pequeno, mas uma gracinha de área verde bem no centro da cidade.
Também Sr. Marimbondo, será que em alguma outra cidade há uma sede do governo tão verde quanto o Parque dos Poderes??
Posso estar pecando nos meus conceitos, mas se tiver, gostaria que você compartilhasse o seu conhecimento do resto do Brasil comigo.

Bruna Andrade disse...

Continuação...
Quanto ao problema do excesso de asfalto e concreto, é o preço da civilização meu querido, não há progresso civil sem concreto e asfalto.
Casinha de sapé num rola mais hoje em dia.
Caso esteja tão incomodado com a quantidade de asfalto, temos Terenos a 22km de distancia.
Lá é bem mais provinciano, bem menos cinza, com o ar mais puro, não tem acidentes todos os dias.
Temos várias opções no MS, agua clara, dois irmãos do buriti, nova alvorada do sul, lá nem asfalto tem, você ficaria bem mais à vontade lá!!
Não né, você é do tipo hipócrita, que gosta de luzes e shoppings, por isso está em Campo Grande, e gosta de criticar o crescimento civil, gosta de meter o bedelho na administração alheia.
Igualmente prezado Maribondo, se for de seu interesse, eu gostaria que você citasse uma só cidade perfeita, sem problemas de administração, com um governo impecável. Umazinha só, e nem precisa ser no MS ou no Brasil. Se você me convencer de que há uma cidade no mundo que não tenha problemas, eu lhe peço públicas desculpas.
Às vezes, a cidade é limpa, é bonita, é cultural, é rica, mas não se respeita a liberdade individual.
Às vezes a saúde é impecavel, mas há falhas na segurança.
Às vezes, as melhores equipes de segurança estão à postos em cada esquina, mas as escolas são lamentáveis.
Já que o senhor tem tantas idéias de administração, tantas críticas, e tantas soluções, (porque já dizia minha mãe: Você só tem uma crítica se tem uma solução para o problema, se num tem solução, então você num tem uma crítica, você tem um palpite de maria palpiteira, de vizinha lavadeira e isso é muito feio!!)
Então como eu ia dizendo, como o Sr. é tão inteligente e tem tantas críticas com soluções aplicáveis, deveria administrar a nossa querida Campo Grande.
Eu até votaria em você, se você se candidatasse e mostrasse a solução para todos os problemas de uma capital.. Te apoiaria até como Presidente..
O problema é que eu infelizmente não acredito nessa sua capacidade toda e acho que você um passa de uma Maria Palpiteira, que gosta de apontar o defeito alheio ao invés de curtir as inúmeras qualidades que a nossa cidade tem!!!!