terça-feira, 25 de maio de 2010

Vã existência

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Não tem na terra quem já não tenha feito —a si próprio e aos seus semelhantes— a pergunta: “de onde viemos, pra onde vamos?” Nenhum ser humano sabe porque realmente o homem existe. Mas muitas teorias já foram formuladas, muitas esquecidas e muitas outras radicalmente defendidas a custa de muito sangue, suor e lágrimas —nos dias de hoje sexo, drogas e rock'n'roll. A filosofia é uma coisa que discute filosofia e discute sobre a nossa existência neste planetinha que sofre nas nossas implacáveis e daninhas mãos.


Mas ninguém ainda provou qual a nossa utilidade na Terra. De onde viemos? Para onde vamos? O que devemos fazer? O que está além da inexorável rotina da vida: nascer, crescer e morrer? Um religioso otimista diria que Deus criou a Terra com todas as suas características, recursos e ambientes para que todos os seus habitantes pudessem exercer os valores da irmandade, fraternidade, paz, respeito ao próximo, amor y otras cositas más.


Já um religioso pessimista diria que Javé cometeu um erro ao criar esse maldito ser humano (que seria sua obra-prima) e que todos eles serão julgados, condenados e queimados no fogo do inferno. Não podemos esquecer que Deus também inventou o conceito de sala de espera quando criou o purgatório. Um religioso sádico diria que Deus se diverte com tudo que nós fazemos. Fica vendo tudo em seu computador ultra-sofisticado, talvez com um sonhado processador quântico. A vantagem é que quando ele quer mudar alguma coisa na trama, ele consegue.


E os filósofos? Discutem, debatem, dialogam e não chegam a conclusão alguma. Donde eu ter chegado à conclusão de que nem Platão, nem Sócrates, nem Jesus Cristo, nem Kant, Nietzsche ou Descartes, ou ainda o inefável Paulo Coelho, foram grandes filósofos coisa nenhuma. Nem tomistas, nem atomistas, escolásticos, cínicos ou outros que sejam, chegaram a desvendar esse mistério. Um ateu acha que tudo é muito normal, esse negócio de morrer, nascer. Ele acha que quando morrer vai virar pó, assim como sua consciência. Para ele igreja é uma bela construção, um lugar para meditação e reflexão. Nada tem um papel divino, as coisas são como são, seguem as leis da natureza.


Muita gente, muita mesmo, vem se dedicando ao longo dos séculos a descobrir qual é a utilidade do ser humano, mas nenhum desses dignos senhores e seletos grupos de senhores conseguiu chegar perto de alguma conclusão. Será que somos causa? Ou será que somos efeito? Nossa laboriosa existência no terceiro planeta do sistema solar pode ser fruto da força da natureza (Javé ou qualquer outra entidade) que nos criou do nada? E o homem vive nessa eterna busca, que o frustra e o mesmo tempo o faz continuar buscando. Talvez seja porque o homem é o único animal que acha que pode melhorar.


Ao se comparar, chega-se à conclusão de que a diferença do homem para os outros animais é o tal do dedo em formato de pinça —mas isso parece tão pouco. Penso, porém, que a verdadeira diferença, que nos gerou tantos benefícios é a mesma que nos causa essa frustração. O homem escolhe para onde quer ir, quando e como, porque quer ir e com quem. Para ele há um leque enorme de possibilidades que, ao menos aparentemente, não existe nos outros seres que habitam a Terra. E talvez por ter essas possibilidades todas, já não saibamos mais qual o nosso papel no planeta.


É possível que o homem —e o homem não passa de um animal—, que recebeu do Criador um cérebro imperfeito, que processa, através dos cinco sentidos, um conhecimento imperfeito do mundo que o cerca —o que faz dele um infeliz e um desesperado—, viva nessa busca porque é o único vivente do planeta que tem consciência da sua própria estupidez. Penso que temos medo de descobrir que, como os outros animais, estamos aqui apenas para nascer, viver e morrer, sem qualquer outra importância que transcenda a nossa vã existência.


Toda vez que penso nessas questões transcendentais a respeito da nossa presença no planeta percebo como é fascinante a alucinação coletiva de uma multidão de seres humanos que se recusam a ver que o mundo é isso mesmo que seus olhos enxergam e seguem os teólogos como as crianças seguiram aquele flautista. Chego à conclusão de que é preciso ser tolerante com as crenças alheias, afinal também tenho minhas cotas de fantasias delirantes.

Texto e ilustração: Luca Maribondo

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